Alas de Hojas
terça-feira, 29 de janeiro de 2013
Delicadeza em excesso
Às vezes eu tenho a nítida sensação que estou muito próxima de descobrir algo muito grande, como se estivesse quase molhando os dedos na margem de um rio enorme (sinto a água respingando), como aquela palavra que quase chegou na língua.
Sinto que é uma resposta que quer me alcançar, que vai me fazer entender a eternidade, me esclarecer qual o jeito certo de se viver e o motivo da existência humana.
Costuma acontecer quando me misturo às pessoas na rua e observo seus rostos desconhecidos. E quando ouço Beatles e quando sinto cheiro de Verbena. Quando vejo um jardim num quadro impressionista. Eu quase posso tocar o mundo atemporal, uma essência muito forte pulsa dentro de mim e uma ansiedade me toma ao sentir essa grande resposta a fácil alcance como o próximo suspiro.
Acontece quando eu penso nos lugares que conheci e no amor que conquistei e quando lembro como eu queria ser só bondade e gentileza quando criança. Acontece também quando me sinto mal por estar desperdiçando meu tempo de juventude sentada num escritório, quando perco a esperança na humanidade ou só no Brasil, quando eu assisto um filme ou leio um livro.
Eu travo os dentes de impaciência e não consigo definir a cor do céu. Então ofereço meus ombros, meu pulmão e minhas mãos e tento voltar ao ponto inicial.
quarta-feira, 14 de novembro de 2012
Tem dias em que estou na minha rotina normal como qualquer mortal e o Flamenco aparece com uma urgência imensa. Sinto como se toda a cultura andaluz pudesse voar da palma da minha mão. Sinto um ardor no peito como se todas as paixões adolescentes do mundo queimassem ao mesmo tempo dentro de mim. Nessas horas tudo que eu mais queria era estar num palco, esmagar essa dor e justificar esse drama, mas não é possível. Então tento aplacar ouvindo Camarón, e ele fala com a minha alma de uma forma que me faz ter certeza que não pertenço a este tempo e nem a este lugar. O Flamenco me inunda como um rio, meu coração só bate em seus acentos e todo meu corpo se transforma num choro seco, misto de desejo e melancolia. Ser "flamenca", pra mim, é a única forma honesta de ser humana.
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
Frequentemente eu penso na minha vida como um imenso bordado, em que eu dou um ponto por dia. A construção de um desenho que só dá para enxergar quando olhamos para o todo, que não adianta querer que faça sentido só numa passada de linha.
E às vezes eu estou tão cansada que nem tenho muita força pra fazer o movimento com a agulha, às vezes preciso trocar de linha, às vezes tenho que parar um pouco pra arrumar o avesso antes de continuar.
E às vezes eu estou tão cansada que nem tenho muita força pra fazer o movimento com a agulha, às vezes preciso trocar de linha, às vezes tenho que parar um pouco pra arrumar o avesso antes de continuar.
Mas tem momentos, entre tantos milhões de buraquinhos, que tenho uma satisfação muito clara em dar um ponto. Em saber do que ele faz parte. Em fazer com capricho para que o desenho do todo possa ficar bonito.
Sou feliz por ter agulha, orientação, pano pra bordar... e em confiar que ainda tenho muitas cores, texturas e espessuras dessa linha que não quer acabar.
Sou feliz por ter agulha, orientação, pano pra bordar... e em confiar que ainda tenho muitas cores, texturas e espessuras dessa linha que não quer acabar.
terça-feira, 10 de abril de 2012
Uma reflexão sobre aniversários
Quando eu era pequena, como toda criança, esperava ansiosamente pelo meu aniversário, contando os dias. O dia de aniversário era sinônimo de festa, ganhar presente, comer doce e fazer um monte de coisas legais só porque era "meu aniversário".
Quando virei adolescente, passei a não gostar muito da data. Porque só eu sabia que era meu aniversário e qual a graça se o mundo não para por causa disso? Como toda adolescente, achava que eu era o centro do universo e tudo era um absurdo: porque eu tinha que ir para a escola se era meu aniversário? Por que eu tinha que pegar ônibus, passar roupa? Como eu podia gastar um dia tão importante assistindo televisão como se fosse qualquer outro?
Hoje em dia, acho que o aniversário nada mais é do que um ótimo pretexto para juntar quem você ama no mesmo lugar e passar momentos felizes junto com essas pessoas, não importa se é uma festa, uma refeição ou só um encontro.
Mas refletindo sobre o assunto: e daí que estou fazendo 27 anos do calendário gregoriano? Estou mais velha, engordei e me aproximo dos 30. Isso é motivo para comemorar? Para mim, celebração tem que ser todo dia, pelo fato de estar viva, por ter permanecido fiel à minha essência e por ter tido sorte nas minhas escolhas.
E por que as pessoas dão parabéns? "Parabéns por ter continuado vivo desde que você nasceu até hoje"? "Parabéns por lembrar quantos anos você tem"?
Não vejo muito sentido nessa comemoração e acho que há uma boa dose de convenção social da qual não há como se libertar. Mas mesmo assim gosto de pensar que hoje é meu aniversário, o dia em que eu nasci, 10 de abril, o "meu" dia. Embora o mundo não pare por isso, basta eu saber, significa uma das coisas mais básicas do autoconhecimento, como saber o próprio nome.
É um dia que provavelmente não será o mais feliz do meu ano, mas será um em que algumas pessoas lembrarão de mim, me ligarão com frases feitas ou postarão recadinhos no Facebook. Um dia para eu refletir sobre a idade que estou abandonando e fazer planos para as próximas idades que pretendo ter mas que não dependem de mim. Um dia para assoprar velas e fazer pedidos. Um dia para receber parabéns não sei bem porque e entrar no meu 28º ano na Terra. Boa sorte pra mim.
sexta-feira, 16 de março de 2012
Só o Rock fala comigo com tanta força e doçura ao mesmo tempo. Quem se comove com o som de uma guitarra sabe do que estou falando.
Às vezes a vida é dura demais e só quem tem sensibilidade ao rock sabe o que é sentir expressada toda sua raiva, sua arte e seu amor com apenas um som. É o eco da urgência tremendo no dente, na insatisfação da individualidade.
A sensação de ouvir um vocal agudo que respira junto com seu estômago. E quando um solo de guitarra machuca mais o seu coração do que seu próprio choro. Você se lembra quão grave foi a sua própria criação. Não há droga, não há poesia que atinja mais a alma humana. Uma vibração de outra vida que é permitida ecoar neste universo.
Ouvir rock é sentir-se animal, mas também é sentir-se a mais espiritual das criaturas. É ouvir cores, desejos e soluções. É pôr a alma pra dançar, é o arrepio necessário. É não se importar se o mundo acaba amanhã. É o sorrir com o cérebro, com a língua e com a ponta dos dedos. É resgatar o que há de melhor em você, pôr asas nos cabelos e por alguns minutos se lembrar porque a vida vale a pena.
Para mim, o rock une a essência mais pura da minha adolescência com toda a maturidade atemporal que cada dia me acrescenta. É como a fonte da sabedoria, do equilíbrio e da compaixão. É o remédio anti-insanidade.
terça-feira, 31 de janeiro de 2012
Precisa ter sentido?
Não foi nenhum filósofo que me contou, eu sempre percebi a vida como uma incessante busca da humanidade por prazer. Antes as pessoas trabalhavam para comer e agora trabalham para ganhar dinheiro para comer, morar, se divertir, vestir, ter atendimento médico e comprar coisas para provar que são melhores que as outras.
O que me intriga é pensar qual o prazer maior nisso tudo. Será que todo mundo acha um sentido para a vida? Ou o sentido em si são os momentos de pequenos prazeres que parecem tão bons exatamente porque são minoria na rotina?
Abraçar o cachorro, morder algo que derrete na boca, respirar fundo na praia, dormir ao lado de quem se ama. Rir com os amigos, sentir a felicidade boba dos sentidos, de receber uma boa notícia ou de descobrir algo que eu não tinha reparado antes. É, me parece suficiente.
Mas às vezes eu sinto que tem algo maior para ser descoberto. Como se a vida fosse reservada para uma interpretação mais profunda do que tudo isso. E não falo do ponto de vista religioso, é racional mesmo, como se houvesse uma grande verdade esperando para ser descoberta ali na próxima curva.
E com toda essa vida tão rápida e tanta informação e tanta mudança, acho que vivemos uma grande ilusão enquanto corremos atrás da bolinha como cachorros. No final, ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais.
quarta-feira, 4 de janeiro de 2012
Minhas impressões sobre Buenos Aires
Buenos Aires é, antes de tudo, surpreendente. Uma cidade onde a arquitetura lembra a Europa, mas os passarinhos cantam como no Brasil, há as mesmas frutas nas quitandas e as mesmas árvores nas ruas.
E a história ferve, recente, debaixo de nossos olhos. As principais avenidas tem nomes como libertador, defesa, independência, conquista... seus paralelepípedos resistentes como sua gente latina.
O que vai ficar na memória para mim não é a comida ou o tango. É o seu jeito organizado, tão urbano e cheio de verde. Os senhores muito elegantes, de terno de linho e chapéu Panamá que se sentam à tarde nos cafés. Os cachorros enormes andando sem coleira ao lado de seus donos, como se soubessem que esse é um povo que deve ser respeitado. Vou lembrar que na livraria a seção de política tem mais destaque que a de auto-ajuda.
Minha experiência foi a de um romance moral onde a arte pulsa como luzes de Natal, na arquitetura, nas inúmeras esculturas em via pública, na música da rua. Onde os monumentos para os mortos parecem celebrar a vida.
Viagem deliciosa e aguda como o gosto do seu vinho. Urgente como seu vento do Sul. Iluminada como o olhar de seus filhos. Espero que 2012 abençoe a terra do sol orgulhoso.
E a história ferve, recente, debaixo de nossos olhos. As principais avenidas tem nomes como libertador, defesa, independência, conquista... seus paralelepípedos resistentes como sua gente latina.
O que vai ficar na memória para mim não é a comida ou o tango. É o seu jeito organizado, tão urbano e cheio de verde. Os senhores muito elegantes, de terno de linho e chapéu Panamá que se sentam à tarde nos cafés. Os cachorros enormes andando sem coleira ao lado de seus donos, como se soubessem que esse é um povo que deve ser respeitado. Vou lembrar que na livraria a seção de política tem mais destaque que a de auto-ajuda.
Minha experiência foi a de um romance moral onde a arte pulsa como luzes de Natal, na arquitetura, nas inúmeras esculturas em via pública, na música da rua. Onde os monumentos para os mortos parecem celebrar a vida.
Viagem deliciosa e aguda como o gosto do seu vinho. Urgente como seu vento do Sul. Iluminada como o olhar de seus filhos. Espero que 2012 abençoe a terra do sol orgulhoso.
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